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Ativismo em Rede

Incentivo ao diálogo e liberação do polo emissor. Muitos falam para muitos. Capital social ampliado, maior é a capacidade de mobilização, maior é o exercício de cidadania, maior é a participação política. É?

 

"Estamos vendo surgir nas ruas uma multidão capaz de se autogovernar a partir de ações e proposições policêntricas, distribuídas, atravessadas por poderes e potências muitas vezes em violento conflito, mas que constituem uma esfera pública em rede, autônoma em relação aos sistemas midiáticos e políticos tradicionais e que emergiu e se espalhou num processo de contaminação virótica e afetiva, instituindo e constituindo uma experiência inaugural do que poderíamos chamar das revoluções P2P ou revoluções distribuídas, em que a heterogeneidade da multidão emerge em sinergia com os

processos de auto-organização (autopoiesis) das redes". 

 

Ivana Bentes, emprefácio do livro Nós somos a rede social, prefácio do livro A internet e a rua: ciberativismo e mobilização nas redes sociais

Primavera Árabe, 15M Espanhol, Ocuppy Wall Street, Jornadas de Junho, entre tantos outros, são movimentos ativistas dotados de características próprias e diferentes contextos, mas que no uso das ferramentas disponíveis no ciberespaço possuem um predicado comum. Posts, hashtags, tweets, memes e vídeos foram utilizados para organizar, divulgar, promover, engajar, comover, potencializar ideias, causas e ações.

 

Ágora

Digital

Internet, a nova praça pública. “Nossa época impõe o desafio de pensarmos a cidadania, a política e a esfera pública em meio às redes telemáticas e à atual disseminação mundial de informações.” O convite à reflexão é feito pelo professor da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia, doutor em Sociologia, André Lemos. 

 

Em Nova Esfera Conversacional, Lemos desenvolve a ideia: “Pode-se assim, como hipótese, pensar no ciberespaço como uma nova esfera pública de conversação onde o ‘mundo da vida’ amplia o capital social, recriando formas comunitárias, identitárias (público), ampliando a participação política”, mas adverte que “a função conversacional das mídias de função pós-massiva pode servir como fator privilegiado de resgate da coisa pública, embora não haja garantias. A participação, a colaboração e a conversação são as bases para uma ação política, mas não garantem a sua efetividade.”

 

O ativismo midiático e a narrativa hackeada 

Em A invenção do Ciberespaço: o ativismo dos grupos de discussão da Internet, o jornalista Fabio Malini esclarece: “Os grupos de discussão e as comunidades hackers abrem, em 1984, uma bifurcação no entendimento do que se apreende sobre o ativismo midiático (o midialivrismo). Por um lado, o midialivrismo de massa reúne experiências de movimentos sociais organizados que produzem mídias comunitárias e populares, de dentro do paradigma da radiodifusão, se afirmando como práticas da sociedade civil alternativas e antagonistas em relação ao modo de se fazer comunicação dos conglomerados empresariais transnacionais e nacionais de mídia (que controlam a opinião pública desde o nível local até o internacional).”

 

 

“Já o midialivrismo ciberativista reúne experiências singulares de construção de dispositivos digitais, tecnologias e processos compartilhados de comunicação, a partir de um processo de colaboração social em rede e de tecnologias informáticas, cujo principal resultado é a produção de um mundo sem intermediários da cultura, baseada na produção livre e incessante do comum, sem quaisquer níveis de hierarquia que reproduza exclusivamente a dinâmica de comunicação um-todos”, completa Malini. 

“Ambos reivindicam uma outra economia política dos meios, em que a propriedade dos meios deve ser comum, isto é, que a cooperação na produção social de conteúdos midiáticos seja regida por uma estrutura decisória coletiva da sociedade civil e por um direito de autor que permita que os conteúdos circulem livremente pela sociedade, e não apenas se torne uma máquina arrecadadora de patentes”, arremata o editor do site do Fórum de Mídia Livre.

 

Apesar de não se encaixar no conceito do midialivrismo, a imprensa convencional tem buscado a participação e o engajamento do público por meio dos recursos e códigos ciberculturais. O gerente de desenvolvimento de produtos digitais do The Guardian, Piers Jones, em entrevista ao “Meio & Mensagem”, explica a prática do Open Journalism pelo jornal britânico. “É um desafio, definido pelos editores do Guardian, para que os jornalistas se abram mais à participação do leitor e para estimular o público a participar das histórias que contamos. Ao termos a participação dos usuários, podemos aprimorar nossas histórias.”

O poder da timeline

Na web 1.0, explica Malini em Cobertura colaborativa nas redes sociais: entre a emergência e a programação, “a narrativa online era produzida sob o modelo da página principal (homepage), cujos conteúdos eram editados e de propriedade do autor do site. Um contexto que faz da homepage a interface síntese do projeto das corporações globais de fazer da internet um grande meio imersivo, em que se é possível controlar todas as interações dos leitores online.”

 

“No modelo 2.0, o usuário não tem "home". Tem "timeline". E nem por usuário é chamado, mas por perfil. A timeline funciona como um mural de notícias, atualizado, ao mesmo tempo, pelo dono e por qualquer outro perfil que ele decida incorporar como amigo, seguidor ou membro do seu “círculo”. Nesse ambiente de colaboração, o público é antes autor; e autor, antes, público. Nessa ecologia participativa o público se transmuta em parceiro e amigo.”

“A narrativa colaborativa encontra na timeline a sua interface padrão. A timeline, antes de ser um dispositivo técnico, é uma expressão de uma nova cultura do consumo e produção da informação, cujo traço peculiar é a instantaneidade, fluxo contínuo de conversação e o engajamento do sujeito naquilo que escreve. Na concepção radical do design da timeline há a extrema dependência da produção colaborativa. Se você não tem amigos, não será lido. Se não é amigo de muitos, não tem acesso àquilo que todo mundo comenta. Portanto, as redes sociais operam dentro de uma esfera pública midiática curiosa, pois que o público não é "formado pelo veículo", mas o inverso.”

 

Em 2013, um estudo do Digital Policy Council (DPC) mostrou que 75% dos chefes de Estado estavam no Twitter. Entre os mais populares, o presidente dos EUA, Barack Obama, lidera com mais de 50 milhões* de seguidores. O líder da Venezuela,  Hugo Chavez, é acompanhado por cerca de quatro milhões**. Dilma Rousseff também está na rede e, inclusive, milita por algumas causas.

 

O ativismo de sofá

Em entrevista concedida ao jornal “O Estado de São Paulo”, via twitter, o filósofo francês Pierre Lévy legitimou o engajamento online ao reconhecer a importância de petições virtuais e ao se mostrar favorável ao slacktivism. 

Idealizador do termo Inteligência Coletiva e autor do livro Cibercultura, Lévy sentenciou: “Não sou contra o ativismo de sofá. Qualquer forma que o cidadão use para se expressar é positiva.” 

 

O professor da Universidade de Otawwa, no Canadá, defendeu investimentos em “educação e alfabetização digital” a fim de elevar o nível do debate virtual, e reconheceu haver risco de aumento no controle da rede pelos governos, a exemplo do que ocorre na China e no Irã, porém concluiu que “há muito mais liberdade de expressão com a internet do que sem ela.” 

 

É importante ressaltar o papel da rede como instrumento, não como entidade. Trata-se, de fato, de uma ferramenta com potencial conversacional, discursivo e deliberativo, mas que apenas funciona como parte da esfera pública, enquanto espaço para o ativismo, se assim for utilizada por instituições, comunidades e indivíduos. A Internet é o que fazemos dela.

 

 

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